Montagem com o logo do Flash com asas indo em direção ao céu. Abaixo diversas fotografias acompanhando o vôo
Categorias:

O fim do Flash e o futuro do conteúdo digital

O fim do Flash me fez pensar que precisamos cuidar do nosso conteúdo digital. Será que no futuro podemos não conseguir mais abrir nossas fotos?

Já faz alguns anos do anúncio da Adobe sobre o encerramento de atualizações e suporte ao Flash. Em dezembro de 2020 a gigante da indústria de software anunciou que realmente iria descontinuar o Flash em 31 de dezembro e recomendou que os usuários desinstalassem o plug-in do Flash Player. Isso significa que existe uma grande quantidade de conteúdo digital que vai simplesmente desaparecer por falta de um plug-in para executar.

Os mais saudosos vão lembrar dos jogos em formato SWF disponíveis em sites como Emotioncard e Humortadela, que podiam ser jogados online ou baixados e executados diretamente na máquina (só de pensar em abrir um arquivo .exe no computador hoje já dá um frio na barriga).

O Flash surgiu para suprir uma demanda por conteúdo multimídia na Web, já que vídeo nativo no navegador demorou para se tornar realidade. Daí para as animações pirotécnicas do Eye4u e da onda de animações de abertura em sites tomou a rede.

Mas o que isso tem a ver com as fotos que eu tiro no meu smartphone?

Daqui alguns meses não conseguiremos mais acessar sites com conteúdo em Flash. E talvez esse conteúdo seja perdido e não será mais recuperado. Galerias virtuais, desenhos animados interativos e mais uma série de conteúdos desaparecerão para sempre se não foram redesenhados em outro formato (como HTML5/CSS/JavaScript por exemplo). Eu mesmo perdi diversas versões de portfólio de qualidade questionável porque foram desenvolvidos em Flash.

Já não é de hoje que os grandes especialistas vem nos alertando sobre cuidados com conteúdo digital. Em 2015 Vint Cerf, o pai da internet, alertou que se as pessoas quiserem ter acesso a suas fotos no futuro elas deveriam imprimi-las. Cerf diz que a Nasa enfrentou problemas para obter informações que estavam armazenadas em tipo de fita cassete. Se a Nasa passou por esse sufoco, imagine nós, simples usuários da rede?

Posso listar aqui ainda a questão das músicas. Tínhamos discos de vinil e fitas cassetes que ainda são possíveis de serem ouvidas devido ao cuidado e o interesse de um pequeno grupo de pessoas. Podemos até incluir o CD nessa lista, pois hoje nem todos os computadores tem um drive para isso. Sabemos que boa parte das músicas já estão online, mas aquela gravação rara do show do Roberto Carlos pode estar em decomposição em algum armário empoeirado.

Outro bom exemplo é a descontinuidade de software. Quem trabalhou com editoração sabe o quanto os softwares PageMaker e QuarkXpress foram utilizados antes de serem substituídos pelo InDesign. Hoje ainda dá para converter alguns desses arquivos no InDesign, mas até quando?

Voltando ao nosso problema, isso pode acontecer porque não sabemos se no futuro teremos hardware ou software para abrir arquivos de fotos. Vai depender de toda uma indústria que tenha interesse em manter o suporte a esses formatos.

Ah, mas hoje as fotos, vídeos e música estão online. Bom, lembre-se que não temos controle de redes sociais e que a qualquer momento elas podem desaparecer. Você lembra que o Brasil era o país com mais usuários no Orkut? Se você não salvou suas fotos que estavam lá, elas agora estão perdidas.

A grande diferença do Flash com as fotos em JPG e PNG é que o primeiro é um formato proprietário, enquanto que os formatos de imagem são abertos.

E isso não se resume somente a fotos. Pense que daqui uns bons anos podemos não conseguir mais abrir arquivos em formato texto, seja em Word ou PDF. O uso de formatos abertos possibilita que possamos reaproveitar esse conteúdo. O HTML é um bom exemplo. Extrair o conteúdo de um arquivo HTML é algo simples e que pode ser facilmente levado para outro tipo de mídia.

Já existem iniciativas incríveis para preservar o conteúdo digital. O Web Archive é um ótimo exemplo que armazena o histórico dos sites da Web (dá para saber como era o site do UOL no final dos anos 90, por exemplo). Mas esse serviço vai além. Eles tem uma área para armazenar na Web jogos antigos, que só rodavam em MS-DOS, como Prince of Percia e Stunts de 1990.

Devemos fazer um exercício de pensar no futuro. Imagine que daqui 100 anos alguém precisa de uma foto sua tirada nos dias de hoje. Será que a pessoa vai conseguir encontrar essa foto se ela não foi impressa? Contei uma história sobre alguém do futuro procurando fotos minhas e sobre a importância de publicar conteúdo em formato aberto em outro artigo.

Isso sem contar o armazenamento desse conteúdo digital. Hoje temos contas em nuvem (como Google, Dropbox ou OneDrive) e backups em CDs ou HDs externos. Será que essa pessoa em 2121 conseguirá ter acesso a sua conta do Google Fotos ou ao seu HD externo cheio de fotos?

Não tenho respostas para essas perguntas, apenas um alerta: Se quisermos preservar a nossa memória digital precisamos pensar em formatos abertos. Formatos proprietários podem ter o mesmo fim do Flash e vão comprometer o acesso ao conteúdo histórico para próximas gerações.